15.09.2025
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Insolvência no agronegócio: um panorama das soluções jurídicas e financeiras

O 7º Congresso de Reestruturação e Recuperação Empresarial, realizado em Cuiabá nos dias 4, 5 e 6 de setembro, trouxe para o centro das discussões o tema “Medidas extrajudiciais de reestruturação e sua efetividade prática”.

Nosso sócio José Afonso Leirião Filho, das áreas de Agronegócio e Reestruturação, Recuperação e Insolvência, participou do evento e concedeu uma entrevista exclusiva ao portal Enfoque Business, para explorar a recuperação e reestruturação de empresas do agronegócio, focando nos desafios e nas soluções jurídicas e financeiras.

Confira os detalhes da entrevista abaixo:

Enfoque Business: Como os atos cooperativos são tratados dentro de processos de recuperação judicial? Há espaço para ajustes na legislação ou no entendimento jurídico?

José Afonso L. Filho: Segundo a recente reforma da Lei de Falências, não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas com seus cooperados. No momento, há uma discussão na jurisprudência a respeito do conceito de ato cooperativo, especialmente quanto às operações de crédito alegadamente celebradas sob as mesmas condições de operações bancárias tradicionais, sendo uma temática que ainda demanda amadurecimento nos casos concretos.

Enfoque Business: Quais medidas extrajudiciais de reestruturação o senhor considera mais eficazes para evitar que produtores rurais cheguem a uma situação de insolvência?

José Afonso L. Filho: As formas de reestruturação a serem aplicadas em cada caso concreto dependem, a nosso ver, da análise do perfil de endividamento do devedor, bem como de seu patrimônio e das garantias que recaem sobre esses bens. Ou seja, não há uma fórmula pronta para todos os casos, mas alternativas que podem evitar ou até melhor preparar o devedor para um processo mais complexo de reestruturação. Após a reforma da Lei 11.101/2005 em 2020, temos verificado um aumento dos casos de tutelas cautelares com o objetivo de promover a conciliação entre devedor e credores, bem como dos casos de recuperação extrajudicial, ante a diminuição do quórum exigido para fins de ajuizamento do pedido inicial de homologação do plano.

Enfoque Business: Sobre a Cédula de Produto Rural (CPR), quais são os requisitos indispensáveis para garantir sua plena eficácia e segurança jurídica nas operações do agronegócio?

José Afonso L. Filho: Além dos requisitos da CPR previstos no artigo 3º da Lei 8.929/1994, é fundamental que o emitente do título esteja legitimado nos termos do artigo 2º da referida lei, de modo a se enquadrar no rol definido pelo legislador, dado que a CPR, em especial sua modalidade com liquidação física, se trata de um título voltado ao financiamento da atividade de produção rural, sendo, portanto, seu lastro atrelado ao exercício dessa atividade e correlatas.

Enfoque Business: O STJ tem se debruçado sobre casos de insolvência no agronegócio. Quais entendimentos recentes o senhor destacaria como mais relevantes para produtores, credores e investidores?

José Afonso L. Filho: Destaca-se o entendimento do REsp. nº 1.991.989 – MA, em que o STJ decidiu tema de absoluta relevância às disputas de essencialidade, fixando o conceito de bem de capital, que é “aquele utilizado no processo de produção (veículos, silos, geradores, prensas, colheitadeiras, tratores” e atestou expressamente que “não há razão apta a sustentar a hipótese de que os grãos cultivados e comercializados pelos recorridos (soja e milho) constituam bens de capital”.

Enfoque Business: Como o mercado de capitais e as fintechs podem contribuir como alternativas de financiamento para o agronegócio diante dos desafios de recuperação e reestruturação empresarial?

José Afonso L. Filho: O mercado de capitais pode contribuir especialmente como vetor de concessão de dinheiro novo em casos de recuperação judicial ou de formas alternativas de reestruturação em cenários extrajudiciais, com a observação, contudo, de que as possibilidades de acesso a essas alternativas de financiamento tendem a depender do nível de governança, organização e transparência adotados pelo pleiteante ao crédito, ponto de especial atenção aos produtores rurais, que em regra adotam estrutura organizacional de baixa governança.

Enfoque Business: As RJs, muitas vezes, têm sido usadas indevidamente, tanto é que muitas são indeferidas pelo juízo. Qual a sua opinião?

José Afonso L. Filho: Não nos parece ser adequada a generalização ou o tratamento da RJ como vilã. Trata-se de mecanismo que possui aplicabilidade em certos casos, mas certamente não é a melhor resposta a todo cenário de crise. Em hipótese de uso inadequado ou abusivo do instituto, deve o Judiciário intervir na análise dos requisitos previstos pela Lei de Falências para o deferimento do processamento da RJ, especialmente a partir da análise da documentação contábil-fiscal apresentada por produtores rurais com vistas à comprovação do efetivo exercício da atividade rural.

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