Bastante aguardada pelo mercado, a CVM divulgou no último dia 24 de setembro a Consulta Pública SDM 05/25, com prazo para respostas até 23/12/25, que irá introduzir nova regra para as ofertas públicas realizadas por meio de plataformas de crowdfunding e revogar a Resolução CVM 88. De forma geral, a nova norma proposta pela CVM atende demandas e preocupações do mercado, em especial após a ampliação do uso das plataformas de crowdfunding para a oferta de Tokens de renda fixa promovida pelos Ofícios SSE 4 e 6 de 2023.
Destacam-se entre as alterações:
(i) conceito de emissor: amplia-se consideravelmente o conceito de emissor passível de captar por meio de plataformas de crowdfunding, revogando a limitação de receita bruta anual máxima de R$40 mi. Para pessoas jurídicas, o requisito passa a ser não ter registro de emissor na CVM e limita-se a captação anual a até R$25 mi, permitindo que essa modalidade de oferta possa ser utilizada por outras empresas que não apenas aquelas consideradas “early stage”;
(ii) securitização: companhias securitizadoras poderão ofertar títulos de securitização via plataformas de crowdfunding, desde que sejam registradas na CVM (atraindo, portanto, o regime da Resolução CVM 60 para as ofertas de securitizadoras realizadas nessa modalidade); os Ofícios SSE 4 e 6 de 2023 permitiam a captação apenas de securitizadoras não registradas na CVM, tendo a norma proposta concedido prazo de até 120 dias para que as securitizadoras que já atuam em crowdfunding requeiram seu registro perante a CVM; a nova norma amplia o montante máximo de captação por patrimônio separado a até R$50mi. A regra proposta veda a possibilidade de emissão de títulos de securitização cujo lastro seja composto por dívida emitida por devedor único ou por devedores únicos sob controle comum que sejam registrados como emissores de valores mobiliários na CVM;
(iii) produtores rurais e cooperativas de produtores rurais: com o objetivo de ampliar o acesso de produtores do agronegócio ao mercado de capitais, a CVM passa a permitir a captação via plataformas de crowdfunding de produtores rurais pessoas físicas, exclusivamente por meio da emissão de CPR-F, desde que estejam obrigados à escrituração de Livro Caixa do Produtor Rural (receita bruta anual mínima de R$4,8 mi) e restritos à captação de, no máximo, R$2,5 mi por safra; do mesmo modo, passa-se a permitir a captação por cooperativas agropecuárias mediante a emissão de CPR-F, CDCA ou Notas Comerciais, até o limite de R$25 mi por ano calendário;
(iv) demonstrações financeiras auditadas: em contrapartida à revogação do limite máximo de faturamento pelo emissor, a norma propõe tornar obrigatória a apresentação de demonstrações financeiras auditadas para os emissores que possuam receita bruta superior a R$30 mi, tanto para sociedades empresárias, cooperativas agropecuárias e produtores ruais pessoa natural – o que pode ser um desafio prático nesse último caso;
(v) limitação de investimento por investidores de varejo: a limitação de investimento por investidor pessoa física por ano-calendário passa a ser aplicável por plataforma e não mais de forma global;
(vi) regime informacional: a norma proposta aperfeiçoa o regime informacional das ofertas realizadas por meio de plataformas de crowdfunding, criando anexos informacionais para cada tipo de emissor e flexibilizando os tipos de informações que podem ser divulgadas por meio do material publicitário;
(vii) tokenização: quanto à tokenização de ativos e a utilização de tecnologia DLT (Distributed Ledger Technology), a CVM se declara agnóstica ao tema, reforçando que sua utilização não altera as obrigações regulatórias da plataforma, porém aguarda comentários do mercado com eventuais sugestões de ajustes para aperfeiçoar a norma nesse aspecto;
(viii) distribuição por conta e ordem: a fim de aumentar a capilaridade das ofertas de crowdfunding, a minuta propõe a possibilidade de distribuição por conta e ordem, de modo que instituições integrantes do sistema de distribuição de valores mobiliários possam ser contratadas para efetuar a distribuição dos valores mobiliários ofertados pro meio das plataformas por conta e ordem de investidores. Para tanto, o distribuidor deverá assumir obrigações equivalentes à da plataforma no que diz respeito ao fornecimento de informações sobre a oferta, verificação de critérios de elegibilidade e suitability do investidor e controles de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo. Adicionalmente, as plataformas e respectivos distribuidores deverão implementar integração sistêmica entre si, assegurando o intercâmbio automático de informações;
(ix) transações subsequentes: a nova minuta também traz aprimoramentos ao ambiente de transações subsequentes, visando gerar maior liquidez para os investidores: (i) o conceito de “investidor ativo”, que é aquele apto a realizar aquisições de valores mobiliários neste ambiente deixa de exigir que o respectivo investidor tenha realizado investimento em ao menos uma oferta pública conduzida pela plataforma nos últimos 2 (dois) anos, deixa de existir, de modo que, para participar de transações subsequentes, basta que os investidores tenham seu cadastro atualizado junto à plataforma ou distribuidor por conta e ordem; e (ii) observadas determinadas regras que visam garantir o tratamento equitativo entre investidores e conferir critérios objetivos de precificação, fica permitida a recompra dos valores mobiliários emitidos por intermédio da plataforma; e
(x) alocação prévia de recursos em teses de investimento: o sindicato de investimento participativo – figura já existente na Resolução CVM 88, e composta por investidores de varejo e por um “investidor líder” com experiência prévia, responsável por atuar junto à sociedade investida ou como interlocutor dos demais investidores – teve o seu escopo ampliado, de modo que, por meio do sindicato, investidores poderão realizar o comprometimento prévio de recursos em uma determinada tese de investimentos, sem a definição a respeito das sociedades a serem investidas, desde que cumpridos os critérios definidos na respectiva tese. Nesse caso, o investidor líder deverá ser um gestor de recursos devidamente autorizado, nos termos da regulamentação aplicável.
Além dessas mudanças, de cunho mais estrutural, a minuta da norma também propõe algumas mudanças pontuais no regime da oferta, abaixo indicadas:
(i) destinação de recursos: a vedação da utilização dos recursos captados pela sociedade de pequeno porte para a aquisição de participação minoritária em demais sociedades e/ou concessão de crédito a outras sociedades, que já existia na norma hoje vigente e cujo objetivo é evitar a criação de sociedades que emulem o funcionamento de fundos de investimento dá lugar uma vedação mais genérica, de caráter principiológico, que impede a utilização de recursos captados para constituição de portfólio de participações em outras sociedades. A exceção são os casos em que a aquisição de participação esteja estritamente vinculada ao desenvolvimento da atividade do emissor;
(ii) montante mínimo das ofertas: o montante mínimo das ofertas no caso de distribuição parcial foi alterado, de modo que: (a) em ofertas de sociedades empresárias de pequeno porte, passa a ser de 50% (cinquenta por cento) do valor alvo máximo; (b) no caso de ofertas de títulos de securitização, o valor mínimo deve ser estabelecido caso a caso e deverá levar em conta a estrutura econômico-financeira da operação; e (c) no caso dos produtores e cooperativas, permanece o valor de 2/3 (dois terços) do total ofertado;
(iii) período de desistência: o período dentro do qual o investidor poderá desistir do investimento realizado passa a ser de 2 (dois) dias contados da confirmação do investimento, em oposição aos 5 (cinco) dias hoje vigentes;
(iv) divulgação de inadimplentes: além da divulgação dos emissores que estejam inadimplentes em relação a obrigações de cunho informacional, a norma passa a exigir a divulgação da inadimplência relativa a obrigações financeiras relacionadas aso valores mobiliários ofertados por meio da plataforma, sendo que, quaisquer dessas inadimplências deverão impedir o emissor de realizar novas ofertas.
As regras referentes a escrituração de valores mobiliários, registro e cancelamento de registro das plataformas de crowdfunding, bem como aquelas relativas ao profissional responsável por controles internos, não sofreram quaisquer alterações.