O setor do agronegócio brasileiro, reconhecido como um dos pilares da economia nacional, tem enfrentado uma conjuntura desafiadora nos últimos anos. O cenário de juros elevados, aliado à escassez de linhas de crédito rural acessíveis e à maior seletividade dos bancos, criou barreiras relevantes ao financiamento da produção.
Neste ambiente restritivo, a operação de barter ressurge com sofisticação e força estratégica, oferecendo uma alternativa sólida ao financiamento agrícola tradicional. Trata-se de uma solução que assegura liquidez ao produtor rural sem depender exclusivamente do sistema bancário convencional.
O barter é uma operação de troca em que o produtor rural recebe insumos – como sementes, fertilizantes, defensivos agrícolas e combustível – e, em contrapartida, compromete-se a entregar parte de sua produção futura (geralmente commodities como soja, milho ou algodão) como forma de pagamento. Essa modalidade, ao evitar o desembolso financeiro imediato, permite ao produtor garantir o plantio mesmo diante de um mercado financeiro restritivo.
Por estar vinculada ao ciclo natural da produção agrícola, a operação de barter alinha obrigações financeiras e receitas futuras, mitigando o risco de descasamento de fluxo de caixa e proporcionando maior previsibilidade ao produtor.
Com a crescente sofisticação do mercado e a necessidade de mitigar riscos jurídicos e financeiros, o barter evoluiu para incluir estruturas mais complexas, como:
First Loss: modelo em que uma das partes (normalmente o originador ou financiador) assume a primeira camada de perda em caso de inadimplência do produtor, protegendo os demais investidores ou credores da estrutura.
Risk Sharing: compartilhamento dos riscos de crédito e de produção entre fornecedores de insumos, tradings e instituições financeiras.
Co-obrigação: estrutura contratual na qual uma terceira parte garante solidariamente o cumprimento das obrigações do produtor, conferindo maior segurança jurídica à operação.
Essas variações permitem maior alavancagem e penetração do crédito, especialmente quando se incorporam instrumentos de garantia como alienação fiduciária, penhor agrícola, fianças e até seguros paramétricos.
Além da flexibilidade contratual, estima-se que as operações de barter respondam por aproximadamente 30% a 40% do financiamento da produção agrícola no Brasil, especialmente em culturas como soja, milho e algodão. Esse percentual reforça a importância desse instrumento, sobretudo em cenários de maior restrição bancária e elevação de custos financeiros.
Outro ponto jurídico de significativa relevância para a estruturação das operações de barter diz respeito ao tratamento conferido à Cédula de Produto Rural com liquidação física (“CPR”), especialmente em contextos de recuperação judicial. Nos casos em que a operação de barter seja materializada por meio de CPR, aplica-se o disposto no artigo 11 da Lei nº 8.929/94, segundo o qual os créditos e garantias vinculados a tais CPRs não se submetem aos efeitos da recuperação judicial do emitente. Isso significa que, mesmo diante da insolvência do produtor, o credor mantém o direito à restituição dos bens prometidos, desde que não haja impedimento por força maior ou caso fortuito.
Essa prerrogativa de extraconcursalidade confere uma robusta camada de segurança jurídica à operação, tornando o barter ainda mais atrativo para fornecedores de insumos, tradings e instituições financeiras. Ao assegurar que os bens vinculados à CPR com liquidação física — na qual a operação de barter esteja formalmente estruturada — não serão englobados no plano de recuperação judicial, o instrumento reforça a confiança dos credores quanto ao cumprimento da obrigação pactuada. Esse fator é particularmente relevante em cenários de maior inadimplência ou instabilidade econômica, pois protege a estrutura de financiamento mesmo nos casos mais extremos de crise financeira do devedor rural.
Para o produtor rural, o barter garante acesso a insumos e tecnologia, mesmo em períodos de crédito escasso ou taxas inviáveis. Também proporciona previsibilidade no custo de produção e na gestão de riscos de preço. Para a indústria fornecedora de insumos e as tradings, a operação representa uma forma de fidelização e garantia de compra da produção, além de permitir maior previsibilidade na originação de grãos.
Além disso, a operação cria um ecossistema de interdependência positiva, onde todos os elos da cadeia são beneficiados, tornando a estrutura mais resiliente diante de crises financeiras ou choques exógenos.
Diante da conjuntura de juros altos, seletividade bancária e incerteza econômica, a operação de barter se apresenta como uma solução sólida, prática e adaptável para viabilizar o financiamento da produção agrícola. Sua capacidade de integrar agentes do setor produtivo com o mercado de insumos e de grãos, utilizando a própria produção como moeda de troca, demonstra não apenas viabilidade econômica, mas inteligência financeira.
Mais do que uma alternativa, o barter se consolida como uma estratégia de sustentabilidade financeira para o agronegócio brasileiro – uma ferramenta moderna e eficiente para enfrentar os ciclos adversos do crédito rural.