14.07.2025
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Alta dos juros e o mercado de M&A no Brasil: desafios e oportunidades

O mercado global de fusões e aquisições (M&A) iniciou 2025 com sinais de recuperação, apesar do cenário macroeconômico adverso. Segundo relatório da S&P Global, o valor total das transações anunciadas no primeiro trimestre atingiu US$ 719 bilhões, avanço de 8% em relação ao quarto trimestre de 2024 e de 15% frente ao mesmo período do ano anterior . Contudo, as tensões comerciais entre EUA e China geram incertezas, exigindo maior seletividade e cautela dos investidores.

Na América Latina, o Brasil manteve a liderança regional em volume de operações, com 399 negócios no primeiro trimestre de 2025, uma redução de apenas 2% em relação ao mesmo período de 2024 . No entanto, o valor movimentado foi de US$ 6,864 bilhões, representando queda de 24% na comparação anual , evidenciando uma mudança no perfil das operações: mais enxutas, com foco estratégico e crescente uso de mecanismos criativos de pagamento.

A elevação da Selic para 15% ao ano confirma um ciclo monetário contracionista, imposto por um cenário inflacionário desafiador e expectativas desancoradas, com perspectiva de manutenção dos juros elevados por período prolongado . Para o mercado de M&A, esse contexto encarece o financiamento clássico via dívida, reduzindo a atratividade de operações alavancadas e estimulando estruturas de aquisição criativas e juridicamente complexas.

Ganham relevância mecanismos como earn-outs, vendor financing, pagamentos escalonados e estruturas híbridas de dívida e equity. Tais alternativas mitigam o impacto do custo de capital, mas demandam precisão jurídica, sob pena de transformar uma solução financeira eficiente em um ponto de litígio.

Mesmo em ciclos monetários restritivos, o M&A mantém papel central na reorganização de setores e cadeias produtivas. Consolidações horizontais ampliam participação de mercado, diluem custos fixos e fortalecem o poder de negociação. Aquisições verticais, por sua vez, possibilitam ganhos de sinergia e controle de suprimentos, fatores relevantes em ambientes inflacionários e voláteis. Tais estratégias são especialmente valorizadas em setores fragmentados ou com margens decrescentes.

Além disso, a alta dos juros acelera movimentos de desalavancagem, venda de ativos não estratégicos e reorganização de portfólios por grandes grupos econômicos, criando um pipeline de oportunidades para compradores estratégicos e financeiros com perfil oportunista. O M&A, nesse contexto, cumpre função tática na recomposição de estruturas de capital, favorecendo empresas mais enxutas, resilientes e competitivas.

Do ponto de vista institucional, empresas que buscam captar recursos ou acessar o mercado de capitais também se beneficiam de uma agenda ativa de M&A. A incorporação de ativos ou fusão com players complementares acelera a maturação de modelos de negócios, atrai investidores e eleva o valuation em rodadas futuras. Assim, o M&A não apenas responde a pressões externas, mas antecipa movimentos estratégicos, funcionando como motor de crescimento e valorização patrimonial.

Paradoxalmente, o cenário de juros elevados também cria oportunidades únicas. Empresas com fundamentos sólidos, mas afetadas pelo encarecimento do crédito, podem ser adquiridas a múltiplos mais acessíveis. Nesse ambiente, compradores com capital próprio ou acesso facilitado a funding estão em posição privilegiada para capturar valor. O M&A, portanto, se consolida como ferramenta de reestruturação estratégica e alocação eficiente de capital.

Assim, o atual ciclo de juros altos, embora imponha desafios ao financiamento tradicional, redefine o perfil das transações no Brasil, exigindo maior sofisticação jurídica, estruturas alternativas de pagamento e um apetite mais qualificado ao risco.

Artigo publicado originalmente na Revista Capital Aberto. Clique aqui para acessar.

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