As transmissoras de energia conseguiram, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), um primeiro precedente numa importante discussão tributária: a que trata da margem de presunção de lucro, sobre a qual incidem o Imposto de Renda (IRPJ) e a CSLL, das atividades de construção dessas empresas. A 1ª Turma entendeu que devem ser aplicadas as margens de presunção de 8% e 12% sobre a receita, para o IRPJ e a CSLL, respectivamente – e não de 32% para ambos, como defende a Receita Federal.
Essa foi a primeira decisão colegiada de um tribunal superior sobre o tema, segundo tributaristas. Ela vale para empresas no regime do lucro presumido e é importante porque uma margem maior significa que os impostos devidos serão mais altos, mesmo sem alteração nas alíquotas, que são de 25% para o IRPJ e de 9% para a CSLL.
A discussão envolve a Solução de Consulta nº 174, de 2015, da Receita Federal, segundo a qual as “receitas de construção vinculadas a contratos de concessão” deveriam ser tributadas com base na Lei nº 12.973/2014, que instituiu margem de presunção de lucro de 32% para IRPJ e CSLL.
As empresas discordam dessa interpretação. Para elas, o dispositivo da lei se aplica às empresas de construção contratadas pelas transmissoras para erguer a infraestrutura necessária à operação. Já a Receita se apoia na definição contábil das receitas — financeiras, de construção e de operação/manutenção.
Os contribuintes entendem que a Receita usa definições contábeis para atribuir natureza jurídica distinta às receitas de construção, permitindo tributação mais alta. A maioria das decisões judiciais de 1ª e 2ª instância foi favorável às empresas.
Segundo Diogo Olm Ferreira, sócio do escritório VSBO Advogados, desde 2015 foram proferidas 33 decisões de 2ª instância sobre o tema, sendo 24 favoráveis aos contribuintes. Os TRFs da 5ª e 6ª Regiões ainda não analisaram a questão.
No STJ, prevaleceu o voto do relator, ministro Paulo Sérgio Domingues. Ele apontou que a Lei nº 9.074/1995 e o Decreto nº 2.655/1998 estabelecem que as instalações fazem parte do contrato de concessão e que a concessionária é responsável pelos reforços nas instalações.
Assim, com base no contrato firmado com a Aneel, o ministro entendeu que a receita da empresa advém da prestação do serviço de transmissão de energia elétrica, e não de construção civil (REsp 2179978).
“As receitas decorrentes da transmissão de energia elétrica possuem natureza jurídica de remuneração por serviços de transporte de carga, considerando que a energia elétrica é um bem móvel, e os percentuais de presunção de lucro devem ser de 8% (IRPJ) e 12% (CSLL)”, afirmou.
Embora a solução de consulta da Receita não tenha sido diretamente questionada, a decisão deve impactar outros processos em curso. “A decisão é um tranquilizador, pois foi unânime e bem fundamentada”, disse Diogo Olm Ferreira.
Para o advogado Marcelo Baeta Ippolito, que atuou no processo, a decisão do STJ vai balizar muitos processos que estão parados. “A questão é sensível ao setor, pois a precificação do serviço influencia a vitória em licitações. Concessionárias optam pelo lucro presumido para mitigar o custo tributário, o que influencia a tarifa.”
Ele destaca ainda que mudanças na legislação do IR não justificam reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos — ao contrário de tributos como PIS/Cofins —, o que torna a decisão ainda mais relevante.
Segundo Ferreira, há outros processos sobre o tema tramitando no STJ, principalmente na 1ª Turma. “A unanimidade dá uma sinalização clara da manutenção da jurisprudência favorável aos contribuintes.”
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) foi procurada, mas não se manifestou até o fechamento da edição.
Artigo originalmente publicado no Valor Econômico. Clique aqui para acessar